9 de ago. de 2011

O Terapeuta Ocupacional no Ambiente Escolar

Entrevista realizada para a Revista Crefito 3

Crefito 3 - Há quanto tempo é terapeuta ocupacional?
Ariela Goldstein - Há 10 anos. Me formei em 2001 na Pontifícia Universidade Católica de Campinas. E em 2006, fiz especialização em Desenvolvimento Infantil na Universidade Federal de Minas Gerais.


Crefito 3 - Conte um pouco sobre o seu trabalho de consultoria para as escolas? Como é o seu trabalho na clínica também?
Ariela Goldstein - O trabalho de consultoria que realizo nas escolas, está diretamente ligado ao trabalho que realizo na clínica. Nas escolas, meu primeiro passo é esclarecer aos professores o que afeta o desenvolvimento da criança seja uma síndrome ou deficiência, quais são as características que esta criança apresenta que irão influenciar seu desempenho. Um segundo passo, é mostrar e enfatizar as habilidades que esta criança tem. Para então, propor atividades que desafiem a criança, o que levará a uma aprendizagem. É importante lembrar que estes desafios devem ser sempre “na medida certa”. Na escola são feitas sugestões que possam ser usadas para diminuir as dificuldades da criança e facilitar sua inclusão.
Na clínica, sigo o mesmo caminho. Esclareço dúvidas em relação ao diagnóstico e o quanto isto interfere em seu desempenho ocupacional. È importante esta compreensão dos pais, pois estes passam a ter uma visão diferenciada de seu comportamento e desempenho nas atividades diárias, no brincar e nas atividades escolares.
A abordagem com a qual trabalho chama-se Integração Sensorial – IS é um processo neurológico de organização das sensações do corpo que ocorre em todos nós. Integrar e organizar as informações sensoriais de uma forma adequada permite que tenhamos respostas adequadas ao ambiente.
As crianças que apresentam disfunção de integração sensorial têm dificuldades motoras e de comportamento, que resultam em grandes dificuldades em seu desempenho escolar, no brincar e nas atividades diárias.


Crefito 3 - O que o terapeuta ocupacional pode fazer para melhorar a saúde das crianças na escola?
Ariela Goldstein - O terapeuta ocupacional irá analisar o desenvolvimento das habilidades motoras e de processamento da criança no ambiente escolar, e posteriormente sugerir adaptações ou modificações para os professores. Estas orientações podem ser desde adaptação do espaço físico, mobiliário, dar um tempo extra para terminar as lições a estratégias específicas para a escrita e atividade em sala de aula.

Crefito 3 - Como adequar o mobiliário para crianças de diferentes, idades, tamanhos, pesos? Como tornar as salas e ambientes atrativos ?
Ariela Goldstein - Uma criança nunca é igual à outra. Algumas adaptações simples podem ser realizadas de acordo com o perfil da criança. Podemos por exemplo, colocar um apoio para os pés, caso a criança não alcance seus pés no chão; usar um adaptador no lápis; e até definir um lugar estratégico para a criança se sentar em sala de aula para poder desempenhar melhor seu papel. As escolas devem ter mais de um tamanho de cadeiras ou de mesas para acomodar os diferentes tipos físicos das crianças. Isso inclui cadeiras adaptadas para as crianças que as necessitem.
O ambiente escolar deve ser amplo, ventilado e com boa iluminação. Ruídos de ventilação e automóveis por exemplo, devem ser eliminados. Figuras ilustrativas referentes ao conteúdo da aula podem ser usadas. É importante que as crianças tenham um espaço para guardar seus pertences, que o espaço para a circulação seja adequado e o ambiente sempre limpo. Pequenos detalhes como plantas, objetos decorativos com temas apropriados para a idade tornam o ambiente mais convidativo e ajudam a criança a aprender a cuidar de seu ambiente.


Crefito 3 - Qual a importância da brinquedoteca e dos espaços lúdicos dentro de uma escola?
Ariela Goldstein - É muito importante que a escola ofereça espaços para a criança brincar. Isto inclui parques, brinquedos educativos e uma área livre, onde a criança possa apenas correr e inventar brincadeiras com seus colegas. O espaço para uma brincadeira de movimento é ainda mais importante que uma brinquedoteca.
A criança que brinca, aprende. Aprende sobre o seu corpo e o ambiente. Aprende sobre como se relacionar.
Portanto, as escolas que oferecem um espaço para a brincadeira, estarão contribuindo no desenvolvimento psicomotor, cognitivo e social.



Crefito 3 - Há uma lei federal que garante o acesso das crianças com deficiência em escola regular. Qual o papel da terapeuta ocupacional para a adaptação das crianças na escola? Quais os equipamentos que podem ser desenvolvidos?
Ariela Goldstein - O terapeuta ocupacional juntamente com o professor, poderá auxiliá-lo a preparar atividades de esclarecimento sobre a dificuldade da criança, evitando assim, a estigmatização da criança. Pode também ajudar a preparar as outras crianças da escola para receber e interagir com a criança que tem algum tipo de limitação.
As adaptações que serão realizadas, será de acordo com a necessidade da criança. Por exemplo: rampa da acesso, mesa acoplada à cadeira de rodas, portas largas, adaptadores no lápis (giz, pincel, tesoura, apontadores), almofadas no acento, mesas com inclinação, computadores, entre outros. Terapeutas ocupacionais são capazes de adaptar mobiliário e sugerir mudanças que ajudam a adaptação da criança ao ambiente escolar.


Crefito 3 - O trabalho do terapeuta ocupacional na escola envolve também a comunidade, pais e professores? Os professores recebem treinamento pela sua consultoria?
Ariela Goldstein - O terapeuta ocupacional em seu trabalho, procura envolver todos que de alguma forma possam contribuir para o desenvolvimento da criança. Os pais são peças fundamentais para o trabalho, assim como a escola.
A escola quando se mostra envolvida com as dificuldades do aluno, pode receber um treinamento focado nas suas necessidades. A consultoria na escola é sempre uma oportunidade para educar as pessoas sobre nosso trabalho e metodologias usadas.


Crefito 3 - Recentemente foi divulgada pesquisa no jornal “Estadao de S.Paulo”, dizendo que a cidade de são Paulo é recordista em casos de bullyng. Como o terapeuta ocupacional pode lidar com o tema, já que o bullyng acontece geralmente dentro da escola?
Ariela Goldstein - Junto ao professor, o terapeuta ocupacional irá pensar em atividades que promovam uma reflexão entre os alunos sobre as diferenças que podem existir entre eles, onde cada um perceba suas dificuldades e potencialidades em seu dia a dia. Um trabalho de sensibilização às diversidades. O trabalho para eliminar o bullying deve ter um olhar tanto para o problema de quem sofre o bullying como também de que o faz; às vezes o bullying é uma forma da criança também pedir ajuda.


Crefito 3 - Hoje em dia, existem muitas crianças diagnosticadas com transtornos de hiperatividade e déficit de atenção, elas freqüentam escola regular. Como os terapeutas ocupacionais trabalham com essas crianças com dificuldade de aprendizagem? O profissional pode ajudar a identificar e tratar outros casos de distúrbios de aprendizagem, como a disgrafia (letra feia), por exemplo?
Ariela Goldstein - Uma cena muito comum no ambiente escolar atualmente, são crianças que se apresentam inquietas em suas carteiras, que conversam a todo o momento com os colegas e se distraem com todos os movimentos internos ou externos da sala. Estas crianças geralmente têm dificuldades em acompanhar o proposto em sala de aula apesar de não apresentarem déficits de inteligência. São crianças diagnosticadas com TDA/H.
Os principais sintomas do TDA/H são: dificuldade de manter a atenção, inquietação (agitação motora e/ou mental) e impulsividade. Um outro sintoma que pode ser observado mas é pouco conhecido, é a dificuldade no processamento das informações sensoriais. Muitas crianças com TDA/H, apresentam um mau processamento sensorial, “falhas” no recebimento das informações sensoriais as quais resultam no comportamento inadequado da criança no ambiente,ou seja, na falta de atenção ou movimentação constante.
No caso de crianças que têm dificuldades, existe uma falha de comunicação entre o que os sentidos recebem e o que chega ao cérebro de modo que as informações chegam com intensidade exagerada ou com intensidade diminuída. Em qualquer dos casos, a criança poderá ter dificuldade em regular seu comportamento. A habilidade para integrar essas informações sensoriais é essencial para a aprendizagem e organização do comportamento. O terapeuta ocupacional no consultório usará atividades que desafiam as habilidades da criança e estimulam respostas organizadas e diferentes estímulos sensoriais. Na escola, podem sugerir estratégias para os professores que podem ajudar aquela criança especificamente mas que também podem ser usadas para beneficiar todos.
Crianças com TDA/H podem estar sujeitas a esta dificuldade de integrar as informações sensoriais. Se em um ambiente escolar o professor começa a ter uma visão diferenciada desta criança, conseguirá lidar melhor com a situação e consequentemente a criança passará a ter respostas mais adequadas ao ambiente.
Outras dificuldades de aprendizagem também podem ter sua origem neste processamento sensorial inconsistente, sendo a disgrafia por exemplo. Fatores como: tônus, equiliíbrio, lateralidade e postura estão diretamente ligados ao processamento sensorial da criança.


Crefito 3 - Você acha que todas as escolas deveriam ter pelo menos um terapeuta ocupacional trabalhando? Por quê?
Ariela Goldstein - Sim. O terapeuta ocupacional tem seu olhar na ocupação humana, e a escola faz parte disto. É uma das peças fundamentais para o desenvolvimento da criança.
Muitas crianças apresentam dificuldades em processar as informações sensoriais de uma forma correta, e isto reflete em sua aprendizagem. Má postura, escrita ilegível e hiperatividades são características muito comuns encontradas em sala de aula.


Crefito 3 - Existe algum estudo nacional ou internacional que comprove os benefícios da terapia ocupacional no ambiente escolar?
Ariela Goldstein - Existem estudos nos EUA e lá a lei exige que todas as crianças que apresentam algum tipo de distúrbio, disfunção ou deficiência comprovada por avaliação, tem o direito de receber terapia ocupacional escolar. Essa terapia, diferentemente da que acontece no consultório ou clínica, não é feita para tratar a criança e sim para facilitar a sua inclusão. São tratados pela TO escolar apenas os aspectos que se relacionam à vida acadêmica.

Porque é que a Terapia Ocupacional é importante para as crianças com autismo?

Neste artigo a terapeuta ocupacional Corinna Laurie, que exerce funções em contexto escolar e é diretora da “ Evolve Children’s Therapy...